Analistas veem grande chance de reancoragem de expectativas caso CMN mantenha meta de inflação
É majoritária a projeção entre os economistas de que o Conselho Monetário Nacional (CMN) deve manter a meta do IPCA em 3% ao ano na reunião desta quinta-feira (29), afastando assim os riscos do que poderia ser ama política de leniência com a inflação. Também não é aguardada pela maioria uma ampliação do intervalo de tolerância para o estouro da meta, hoje em 1,5 percentual. Mas uma mudança provável é a troca do sistema de ano-calendário do horizonte relevante da meta para uma meta contínua, alteração bem-vista pelos especialistas.
Com isso, o Banco Central ganharia um argumento forte para iniciar a esperada flexibilização monetária, dizem os analistas. O grande ganho, segundo eles, se dará na chamada reancoragem das expectativas de inflação, um dos fatores mais citados pelo BBC em seus comunicados sobre política monetária pra justificar a manutenção da taxa Selic em 13,75% nas últimas reuniões do Copom.
E notório que essas expectativas saíram do eixo desde o período do governo de transição, no final de 2022, movimento que foi ampliado no início deste ano, quando o tema da elevação da meta passou a ser tratado como uma possibilidade real nos corredores de Brasília.
No primeiro Boletim Focus de janeiro, a expectativa do mercado para a inflação de 2024 estava em 3,70%, subindo semana a semana e chegando a 4,18% em abril. As projeções para 2025 estavam em 3,70% no início de 2023 e as de 2026 chegavam a 3,30% na ocasião. Em ambos os casos, evoluíram para 4% também em meados de abril.
Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating, afirma que a expectativa é que não haja qualquer alteração brusca no regime de metas, pois há um entendimento que é importante preservar a credibilidade do Bacen. “Dessa forma, a expectativa é que o CMN determine a meta central de 2026 em 3% com intervalo de 1,5 ponto percentual”, prevê.
Embora não seja sua principal aposta, Agostini afirma que, caso ocorra alguma mudança sensível, será apenas no intervalo de tolerância, que passaria então para 2,0 pontos percentuais. A explicação seria que, dessa forma, nos próximos anos a autoridade teria maior “área de escape” para acomodar choques de oferta e, com isso, reduzir a rigidez na condução da política monetária.
O economista-chefe da Austin vê tanto na manutenção da meta como na chegada de dois novos diretores para o BC indicados pelo governo dois fortes fatores para que redução de juros comece na reunião de agosto do Copom. “A Austin, após a leitura da Ata, reforçou sua expectativa de redução da Selic em 0,50 ponto percentual em agosto”, afirma.
Para Marco Caruso, economista-chefe do PicPay, o ponto menos controverso na reunião do CMN deve ser o alongamento do horizonte da meta para o modelo contínuo, saindo do atual ano-calendário. “Mas não está claro desde quando a alteração valeria. Sobre o centro da meta, me parece que o novo consenso seria mantê-lo em 3,00%”, estima.
Ele destaca ainda que a melhora recente nas expectativas de inflação – a projeção para a inflação no último Boletim Focus ficou em 3,98% – veio majoritariamente desse entendimento dos analistas. “Ao mesmo tempo, nos perece razoável um alargamento do intervalo da meta de volta para 2 pontos percentuais. Um argumento favorável é a perspectiva de aumento dos eventos climáticos em um país onde a inflação de alimentos tem peso relevante”, pondera.
Nas estimativas de Caruso, a meta implícita no IPCA que se vê no Boletim Focus hoje está próxima de 3,5%. “Se o CMN mantiver a meta em 3,0%, em teoria haveria espaço para uma redução de até 0,5 ponto percentual”, afirma.
No entanto, ele pondera que não é óbvia uma melhora dessa magnitude. “É razoável supor que o mercado continuará mantendo algum prêmio/risco de elevações futuras da meta, levando em consideração que a opinião dos membros do governo no CMN ainda pode mudar em anos posteriores.”
Ele vê como alta a influência da decisão do CMN na próxima decisão do Copom sobre juros em agosto. “A Ata foi clara ao dizer que decisões que induzam à reancoragem das expectativas e que elevem a confiança nas metas de inflação contribuiriam para um processo desinflacionário mais rápido, permitindo, nas palavras dele, uma flexibilização monetária”, explica.
Ele também lembra que os diretores mais cautelosos do BC destacaram na Ata, entre outras coisas, que é necessário observar maior reancoragem das expectativas longas para “para iniciar um processo parcimonioso de inflexão na próxima reunião”.
Debate inapropriado
Rafaela Vitória, economista-chefe do Banco Inter, também aposta na manutenção da meta em 3% para os próximos anos, mas com alteração na forma de medição, com o fim do ano calendário e a mudança para um prazo contínuo, com horizonte mais longo para o seu cumprimento.
“Em um momento que a credibilidade da política monetária segue arranhada, como podemos ver pelas expectativas de inflação de longo prazo desancoradas, o debate sobre a mudança da meta não é apropriado, pois pode tirar ainda mais potência da restrição monetária com estimativas de juro neutro maior, que reflete o risco maior”, justifica.
Além disso, Rafael cita que, caso o arcabouço fiscal tenha o efeito esperado pelo governo, a meta de 3% é bastante factível. E que a inflação mais baixa é um benefício, principalmente para as famílias de mais baixa renda.
Essa decisão de manterá meta e mexer no horizonte relevante para o BC também está nas previsões de Andrea Damico, sócia e economista-chefe da Armor Capital.
“A maior parte dos países já migraram para a meta contínua ou uma meta de médias móveis. Então, acho que faz bastante sentido essa lógica da meta contínua com alargamento do horizonte relevante para o Banco Central, que hoje é 18 meses. Talvez trazer para algo em torno de 24 meses, dando mais flexibilidade para o regime”, explica.
No entender de Andrea, essa alteração do ano calendário para uma meta contínua, com a manutenção da meta, deve fortalecer o próprio regime. “E deve contribuir para uma reancoragem das expectativas, dado que uma parte desse movimento de piora teve a ver com a discussão de alteração da meta de 3% para uma meta mais alta, diz.
Sobre o tamanho e a velocidade dessa reancoragem, a projeção da Armor é de algo próximo de 20 pontos-base de queda nas expectativas. Ele lembra que, no modelo do BC, a inflação para 2024 está 3,4% e uma queda de 0,20% pode ajudar a trazer a projeção para o patamar “ao redor da meta% de 3,0%. Portanto, a manutenção da meta em 3% é considerada fundamental para o BC poder fazer o corte de juros que ele sinalizou na Ata na 3ª feira.
Para o Goldman Sachs Goldman Sachs, se o ambiente inflacionário atual e prospectivo e o balanço de riscos continuarem melhorando e a decisão do CMN sobre as metas de inflação para 2024 até 2026 não trouxerem abalos ao mercado, agosto terá uma “reunião ao vivo” do Copom para um corte de taxa. “Esperamos um corte de 25pb na taxa Selic em agosto”, afirma o banco de investimentos em relatório.
Para Luiz Furlani, gerente de economia da Sicredi Asset, como alguns agentes do mercado ainda consideram provável uma alteração da meta para 2024 para algum valor acima de 3%, um anúncio de manutenção da taxa levará a uma redução das expectativas de inflação.
“Esse movimento deverá ser mais pronunciado nos dados de médio e longo prazo, a partir de 2025, mas também poderá ser verificado para o ano-calendário 2024 e para as expectativas para os próximos 12 meses”, prevê.
O movimento para esse último período, em particular, segundo Furlani, deverá ser suficiente para que o Copom passe a projetar inflação ao redor do centro da meta na sua próxima reunião, reunindo condições para reduzir a taxa Selic em 25 pontos-base em agosto.
Para Lucas Serra, analista da Toro Investimentos, é de se esperar uma a discussão sobre a adoção de metas contínuas de inflação, em linha com o que já é praticado em outros países. “A meta contínua possibilita maior flexibilidade para a condução da política monetária, principalmente pelo fato de o Banco Central não ser mais cobrado sobre o cumprimento da meta no ano calendário”, explica
Ele alerta, no entanto, que tal decisão poderia levar a uma maior desancoragem da inflação nos próximos trimestres, o que vem sendo citado de forma corriqueira pelos membros do Copom em suas divulgações. “Expostos ambos os lados, acredito que a chance de mudança expressiva no regime de metas seja remota”, diz.
Serra diz que, apesar da pressão inflacionária que pode vir a ser observada no segundo semestre e das expectativas do mercado, há uma clara percepção que a inflação está arrefecendo e segue convergindo para a meta.
“Além disso, a própria ata do Copom divulgada na última terça (27), sinaliza para cortes da Selic em breve, com início na reunião de agosto ou de setembro. Portanto, alterações no regime de metas, diante do atual cenário e de tudo que já foi feito, poderia colocar em descrédito a condução da política monetária, dificultando a redução da Selic e gerando ainda mais pressão inflacionária como consequência da desancoragem”, justifica.
Serra diz ser difícil estimar uma velocidade da reancoragem de expectativas caso a manutenção da meta ocorra. “Até mesmo porque o mercado já vem trabalhando com expectativas para a inflação de 5,06% em 2023, relativamente próximo do teto da meta deste ano. Para 2024, por sua vez, as expectativas já estão em 3,98%, sendo que ambas seguem em movimento descendente”, lembra.
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