Reforma Tributária: sob pressão, relator reduz taxação para mais 10 setores e atividades

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Sob forte pressão de lobbies, o relator da Reforma Tributária no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), incluiu mais dez setores e atividades na lista de tratamentos diferenciados, criou uma nova taxação sobre a extração de minério e petróleo e aumentou de R$ 40 bilhões para R$ 60 bilhões o aporte da União ao Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR).

Em contrapartida, o relator excluiu os benefícios tributários de duas atividades e atendeu ao pedido do Ministério da Fazenda para restringir os itens da cesta básica que terão alíquota zero. O desenho da cesta e a forma de divisão dos recursos do FNDR, privilegiando governadores do Norte e Nordeste, devem sofrer resistência no Senado e no retorno da proposta à Câmara, devido às alterações.

Em relação às exceções, a maior mudança foi no número de regimes tributários específicos — aqueles que terão regras diferenciadas estabelecidas por lei complementar. Seis atividades passaram a ser contempladas: agências de viagem e turismo; missões diplomáticas; saneamento; concessão de rodovias; serviços de telecomunicações; e transporte aéreo.

Transporte coletivo rodoviário intermunicipal e interestadual, além de ferroviário e hidroviário, também foi incluído no grupo, mas se trata de um remanejamento: esses serviços estavam previstos na alíquota reduzida e foram realocados.

“A quantidade de setores com regimes específicos preocupa. O IVA [Imposto sobre Valor Agregado] é o tributo mais neutro possível e evita distorções alocativas”, afirma Breno Vasconcelos, tributarista do Mannrich e Vasconcelos Advogados e pesquisador do Insper. “Quando se joga cumulatividade para dentro do sistema, isso gera mais possibilidades de distorções”.

O secretário extraordinário do Ministério da Fazenda para a reforma, Bernard Appy, avaliou  o relatório de Braga como “positivo” e disse esperar que não sejam feitas mais mudanças no texto. Em entrevista à GloboNews, Appy disse nesta quinta-feira (26) que o ele resolve cerca de 75% das distorções existentes atualmente no sistema tributário brasileiro e que a proposta melhora significativamente o cenário tributário atual. O secretário deu “nota 7” para o parecer do relator.

 

A lista de segmentos com alíquota reduzida do novo IVA também sofreu alterações. Foram incluídos comunicação institucional e produtos de limpeza, sendo que este último é limitado a produtos majoritariamente consumidos por famílias de baixa renda. Nessa faixa de tributação, a cobrança equivale a 40% da alíquota-padrão (ou seja, um desconto de 60%).

O relator também reduziu a zero a alíquota da CBS (a parte do IVA de competência federal) para entidades de inovação, ciência e tecnologia sem fins lucrativos. Por outro lado, excluiu o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) do benefício e retirou as vantagens tributárias das atividades de reabilitação de zonas históricas.

Para atender ao lobby da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Braga criou ainda uma quarta alíquota do IVA, com desconto de 30%, para beneficiar profissionais liberais que têm atividades regulamentadas, como médicos e advogados.

Relator rebate críticas

A expansão dessas listas especiais preocupa os setores que ficaram de fora, já que, quanto maior o número de exceções, maior será a alíquota-padrão do IVA. À época da aprovação da reforma na Câmara, a Fazenda calculou que a alíquota poderia chegar a 27% e se tornar uma das maiores do mundo.

Braga nega ter ampliado as exceções e defendeu as inclusões no regime específico. “Quem estiver fazendo essa afirmação, eu queria que me mostrasse a conta”, afirmou. “Saneamento é um contrato de tarifa de água e esgoto na casa dos 210 milhões de brasileiros. Você sabe o que isso significaria? Um contencioso de judicialização em 5.568 municípios”.

Em relação às concessões de rodovias, o relator citou a greve dos caminhoneiros: “Sabe o que iria acontecer nas estradas pedagiadas? Greve de caminhoneiros. O que isso custa para a economia? O Brasil quase quebrou com a greve por causa de centavos no óleo diesel. Você imagina aumentar 25% de IVA no pedágio dos caminhoneiros”.

As principais mudanças

O relatório de Braga incluiu uma trava para evitar o aumento da carga tributária do Brasil — já considerada elevada — com a mudança do sistema de impostos sobre o consumo. O parecer institui um teto de referência, com base na média da receita no período de 2012 a 2021 como proporção do PIB. Caso ultrapasse o teto, a alíquota do novo IVA, que será instituído com a reforma para substituir tributos federais, estaduais e municipais, será reduzida.

O IVA será “dual” e composto por uma parte federal — a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), que vai unificar PIS, Cofins e IPI — e outra estadual/municipal — o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que irá unificar o ICMS (estadual) e o ISS (municipal).

O texto prevê ainda a devolução obrigatória do imposto pago na conta de luz para as famílias de baixa renda. O mecanismo de devolução do imposto é chamado na reforma pela palavra em inglês “cashback” (dinheiro de volta, em tradução livre).

A forma de cálculo da devolução será determinada por lei complementar, após a aprovação da PEC. O cashback será concedido no momento da cobrança, mas o texto aprovado não especifica como será a definição das famílias que terão direito ao cashback de energia. A cesta básica de produtos estendida também terá um sistema de cashback para famílias de baixa renda.

1. Trava para aumento da carga tributária

  • Instituição do teto de referência, com base na média da receita entre 2012 e 2021, apurada como proporção do PIB;
  • A alíquota de referência será reduzida caso exceda esse teto.

2. Comitê Gestor

  • Substituirá o Conselho Federativo, órgão para gerir o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que irá unificar o ISS (municipal) e o ICMS (estadual);
  • Inclui a possibilidade de o Congresso Nacional convocar o presidente do Comitê Gestor;
  • Deliberação: maioria absoluta, mais representantes de Estados que correspondam a 50% da população, mais maioria absoluta dos municípios.

3. Imposto Seletivo (‘imposto do pecado’)

  • Incidirá sobre produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente, nos termos de lei complementar;
  • Terá alíquotas definidas por lei ordinária;
  • Poderá incidir sobre armas e munições, exceto quando destinadas à administração pública. Incidirá uma única vez sobre o bem ou serviço. Na extração, o imposto será cobrado independentemente da destinação.

4. Regime Específico

  • Combustíveis e lubrificantes: as alíquotas serão definidas por resolução do Senado Federal;
  • Inclusão de operações alcançadas por tratado ou convenção internacional, incluindo missões diplomáticas, repartições consulares e representações de organismos internacionais;
  • Inclusão de serviços de saneamento e concessão de rodovias;
  • Inclusão de operações que envolvam a disponibilização da estrutura compartilhada dos serviços de telecomunicações;
  • Inclusão de serviços de agência de viagem e turismo;
  • Inclusão de transporte coletivo rodoviário, ferroviário, hidroviário e aéreo.

5. Rateio das parcelas do IBS entre municípios

  • 80% em relação à população;
  • 10% com base em indicadores de melhoria na aprendizagem e de aumento da equidade, considerado o nível socioeconômico, segundo o que dispuser lei estadual;
  • 5% com base em indicadores de preservação ambiental, de acordo com lei estadual;
  • 5% em montantes iguais para todos os municípios do estado.

6. Cide

  • Combustíveis;
  • Destinação, também, para transporte público coletivo.

7. Zona Franca de Manaus

  • As leis instituidoras dos tributos estabelecerão os mecanismos necessários, com ou sem contrapartidas, para manter o diferencial competitivo assegurado à Zona Franca de Manaus e às áreas de livre comércio existentes em 31 de maio de 2023;
  • Institui a Cide sobre importação, produção ou venda de bens que tenham industrialização incentivada na ZF de Manaus.

8. Cesta básica e cashback

  • A lista de itens da cesta será definida por lei complementar;
  • A cesta social, com alíquota zero, terá itens alimentícios essenciais. A estimativa é de que ela tenha de 30 a 35 produtos;
  • Outra cesta básica, chamada de estendida, terá imposto com alíquota reduzida de 40% da alíquota-padrão. Será criado o mecanismo de cashback (devolução de imposto) dos produtos dessa cesta para famílias inscritas no Cadastro Único (CadÚnico).

9. Seguro-receita

  • Alterado de 3% para 5%.

10. Alíquota reduzida

  • Mantidos os serviços de transporte coletivo rodoviário e metroviário de caráter urbano, semiurbano e metropolitano;
  • Alterada a redação “bens e serviços relacionados à soberania e segurança nacional, segurança da informação e cibernética”;
  • Alterada a redação para inclusão: produções artísticas, culturais, jornalísticas e audiovisuais nacionais, atividades desportivas e comunicação institucional;
  • Alterada a redação: alimentos destinados a consumo humano, produtos de higiene pessoal e limpeza majoritariamente consumidos por famílias de baixa renda.

11. ‘Quarta alíquota’ (intermediária)

  • Terá desconto de 30% da alíquota-padrão; destina-se a serviços de profissões regulamentadas (como médicos e advogados).

12. Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR)

  • Aporte de R$ 20 bilhões em 10 anos, a partir de 2034. Valor total: R$ 60 bilhões;
  • Divisão com base no Fundo de Participação dos Estados – FPE (70%) e população (30%).

13. Prazos para lei complementar

  • Executivo terá 240 dias para envio das leis complementares.

14. Fundos de Infraestrutura

  • Para Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e Pará serão mantidos os atuais fundos estaduais de financiamento da infraestrutura. Esse grupo de estados cobra uma taxa sobre grãos, madeira e minérios (no caso do Pará).
  • Os fundos serão mantidos até 31 de dezembro de 2032. A medida é polêmica porque outros estados, como o Paraná, também querem ser atendidos.

15. Setor automotivo

  • Prorroga até 31 de dezembro de 2032, exclusivamente para as pessoas jurídicas já habilitadas, os benefícios fiscais para projetos aprovados até 31 de dezembro de 2024, vedada a majoração do benefício. Serão reduzidos em 20% ao ano.
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