Dia do Forró: ‘Mulher Rendeira’ tem origem associada a Lampião e versão em espanhol


Zé do Norte gravou 'Mulher Rendeira' em 1953, para filme 'O Cangaço'. Origem da música é comumente associada a Lampião e há relatos de que versos faziam parte da tradição sertaneja antes do cangaço surgir. 'Mulher Rendeira' foi gravada por Zé do Norte para o filme 'O Cangaço', de 1953 Reprodução/YouTube Um dos maiores clássicos do forró ficou conhecido na voz de um paraibano, chegou a ganhar uma versão em espanhol e até hoje há divergências sobre sua origem, que é associada ao cangaço. ‘Mulher Rendeira’ foi gravada por Zé do Norte, de Cajazeiras, no Sertão do estado, para o filme ‘O Cangaceiro’, de 1953, escrito e dirigido por Lima Barreto. A música logo tomou grandes proporções e foi regravada por vários artistas, inclusive pelo ‘Rei do Baião’, Luiz Gonzaga, cuja data de nascimento, 13 de dezembro, foi escolhida como Dia Nacional do Forró. ‘Mulher Rendeira’ foi interpretada por Demônios da Garoa, Trio Nordestino, Elba Ramalho, dentre outros artistas brasileiros. A música, no entanto, não se limitou ao território nacional e ganhou uma versão em espanhol, ‘Mujer Hilandera’, do grupo peruano Juaneco y su Combo, na década de 1970. De acordo com o jornalista peruano Czar Gutiérrez, do El Comercio, a versão em espanhol foi autorizada pelo próprio Zé do Norte, durante entrevista com o produtor peruano Alberto Maraví, na Rádio Tupi, em São Paulo. A missão de interpretar a canção em espanhol foi dada ao grupo Juaneco y su Combo. ‘Mujer Hilandera’ é uma das faixas do disco ‘El Gran Cacique’ e um dos principais sucessos do grupo de cúmbia peruano. Origem de ‘Mulher Rendeira’ Por vezes, a origem de ‘Mulher Rendeira’ é associada ao próprio Lampião. Segundo Wescley Rodrigues Dutra, doutor em letras com foco no cangaço, não há nenhuma comprovação concreta para esta afirmação. Lampião é um dos personagens mais famosos da história brasileira do século passado BENJAMIN ABRAHÃO/IMS O pesquisador diz que a associação começou a ser feita após um dos cangaceiros de Lampião, Volta Seca, ter gravado um disco na década de 1960, após o filme de Lima Barreto, e dito na gravação que o ‘Rei do Cangaço’ costumava cantar a música. “O Volta Seca gravou um disco na década de 1960, onde ele diz que aquela era uma música que Lampião cantava e isso ficou sendo reproduzido. Não há nenhuma documentação concreta que comprove que essa letra teria sido elaborada por lampião. Apesar de que ele era um poeta, fazia alguns versos, mas uma comprovação mesmo é um pouco difícil”, disse Wescley. Wescley ressalta que, enquanto muitos atribuem a composição de ‘Mulher Rendeira’ a Lampião, há também relatos que associam a música à tradição nordestina anterior ao cangaço. Entretanto, a forma como ‘Mulher Rendeira’ é cantada e conhecida de 1953 até hoje foi organizada pelo cajazeirense Zé do Norte. “Alguns afirmam que essa música faz parte da tradição sertaneja anterior ao cangaço. Sintetizando, a música foi organizada da forma que nós conhecemos pelo Zé do Norte”. Quem foi Zé do Norte Alfredo Ricardo do Nascimento, conhecido como Zé do Norte, nasceu em Cajazeiras, na Paraíba, em 1908. Filho de pais pobres, sempre quis aprender a ler e ter uma vida melhor, algo que ele conta no livro ‘As Memórias de Zé do Norte’. Em 1925, decidiu ir para Fortaleza em busca de emprego e lá trabalhou em restaurantes lavando pratos e fazendo café. Zé do Norte na capa do disco 'Brasilidades', com Rogéria Ribeiro Reprodução Sua vida começou a mudar quando encontrou um sargento e disse que queria servir ao Exército no Rio de Janeiro e estudar. O sargento, que também era de Cajazeiras, foi solidário à história do conterrâneo e o ajudou. Na capital carioca, além de aprender a ler, Zé do Norte, que até então não tinha essa alcunha, passou a cantar em rádios e chegou a apresentar programas em rádios como a Tupi. Sobre o apelido, em seu livro de memórias, ele explica. “Eu sempre fui um leitor de Gustavo Barroso. O João do Norte. Então, quando fui fazer o meu primeiro show na Rádio Tupy, os apresentadores [Paulo Gracindo e Manoel Barcelos] perguntaram qual o meu pseudônimo. Então, depressa, me inspirei no João do Norte e disse: Zé do Norte. – Mas, por que Zé do Norte? Perguntaram. – Porque eu sou do Norte e quero defender a música do meu povo”. Na época, era comum em outras regiões se referirem ao Nordeste como Norte. Em 1985, Zé do Norte foi homenageado em sua terra natal, Cajazeiras, no Festival de Artes. A jornalista e professora Mariana Moreira entrevistou o músico e, apesar de não ter nenhum registro fotográfico, ela não esquece a emoção que sentiu. “Entrevistar Zé do Norte foi uma emoção ímpar. Ele, embora vivendo há vários anos no Rio de Janeiro, mantinha a mesma áurea e o mesmo sentimento e o mesmo sabor dos nossos sertanejos, na fala, nos gestos e, até mesmo, nos galanteios”. Segundo Geruíza Barros, sobrinha neta de Zé do Norte, ele morreu em 4 de janeiro de 1992, deixando mais de 100 composições que foram regravadas por vários artistas, como Raul Seixas, Nana Caymmi e Caetano Veloso. Os versos de ‘Sodade, meu bem, sodade’, por exemplo, aparecem na canção ‘It’s a Long Way’ de Caetano. Vídeos mais assistidos do g1 Paraíba
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