Relator apresenta parecer sobre PL das “offshores” com novas regras para fundos exclusivos, mas deixa JCP fora do texto

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Um dia após ser confirmado o relator do projeto de lei que altera as regras de tributação de investimentos mantidos por brasileiros no exterior de forma direta, por meio de controladas (“offshores”) e trusts (PL 4173/2023), o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ) apresentou, na noite de terça-feira (3), parecer preliminar para a matéria aos colegas parlamentares.

Como já esperado, foi incluído no texto o conteúdo da medida provisória que altera as regras de tributação para os fundos exclusivos, terminando com a vantagem competitiva do instrumento, que permitia o chamado diferimento tributário por longos períodos, em relação aos fundos abertos.

Ao longo das discussões sobre a matéria ontem, surgiu a possibilidade de também ser incorporado ao relatório pontos de outro projeto de lei, que trata do fim da dedutibilidade dos Juros sobre Capital Próprio (JCP) da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Mas, por falta de entendimento, o assunto acabou fora do substitutivo apresentado à noite aos parlamentares.

Clique aqui para ler a íntegra do substitutivo apresentado.

Uma ideia que circulou entre a equipe econômica durante o dia foi uma espécie de “solução de meio-termo”, na linha do mecanismo ACE (Allowance for Corporate Equity), para superar resistências à matéria. O debate, contudo, não se mostrou maduro o suficiente para avançar e poderia prejudicar a possibilidade de o substitutivo ser votado nesta noite em plenário.

A equipe econômica do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quer tentar concluir a tramitação do projeto na Câmara dos Deputados nesta semana, de modo a evitar o risco de atrasos em razão de viagem oficial de 10 dias do presidente da casa legislativa, Arthur Lira (PP-AL), para a Índia e a China, marcada para as próximas duas semanas.

No mundo político, há uma percepção de boa vontade de Lira para a votação da matéria, em um movimento para demonstrar ao Palácio do Planalto cooperação em relação à pauta econômica e destravar nomeações prometidas por Lula na Caixa Econômica Federal e na Funasa (Fundação Nacional de Saúde) — pivôs da mais recente crise entre o governo e o “centrão”.

O relatório preliminar do deputado Pedro Paulo mostrou, contudo, que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), cedeu às vontades de Lira em alguns pontos das propostas das “offshores” e dos fundos exclusivos (também chamados de fechados ou “onshore”).

Um deles foi a alíquota aplicada sobre aplicações financeiras mantidas por brasileiros no exterior que quisessem optar por atualizar seus investimentos a valor de mercado em 31 de dezembro de 2023. No texto original, o montante seria tributado em 10%, mas o relator reduziu a alíquota para 6%. O dispositivo deve ajudar o governo a aumentar a arrecadação já no atual exercício orçamentário.

Da mesma forma, o relator decidiu reduzir de 10% para 6% a tributação prevista na regra de transição para os fundos fechados no caso de contribuintes que optarem por aderir antecipadamente às novas regras, com possibilidade de parcelamento. A alíquota cheia vai variar de 15% a 20% a partir de 2024, dependendo da característica de prazo do fundo.

A mudança das alíquotas deve influenciar na arrecadação percebida pelo governo com as medidas. Nas versões originais das matérias, a expectativa da equipe econômica era que a mudança nos investimentos no exterior (sobretudo no caso das “offshores”) ampliassem o potencial de arrecadação em R$ 7,05 bilhões em 2024, algo próximo a R$ 6,75 bilhões em 2025 e a R$ 7,13 bilhões em 2026. Já no caso dos fundos exclusivos, as estimativas apontavam para R$ 3,21 bilhões em 2023, R$ 13,28 bilhões em 2024, R$ 3,51 bilhões em 2025 e R$ 3,86 bilhões em 2026.

Como as alíquotas foram reduzidas, os números podem ser revistos para baixo pelo governo. Mas um integrante da equipe econômica pondera que, com a alteração, é possível que as regras de transição se tornem mais atrativas para o contribuinte, aumentando as adesões no curto prazo — o que poderia ajudar a compensar ao menos em parte as perdas pelas taxas menores cobradas.

Além do efeito fiscal, o governo alega que as medidas visam corrigir distorções no mercado. No caso das aplicações financeiras no exterior, a ideia é eliminar a vantagem competitiva dos investimentos fora do país feitos por brasileiros e especialmente o diferimento tributário permitido pelo uso de “offshores”, que são estruturas constituídas no exterior normalmente para planejamento tributário.

A equipe econômica argumenta que, a partir dessas estruturas, é possível represar rendimentos no exterior, ficando anos sem distribuí-los para o sócio pessoa física no Brasil (ou seja, sem recolher tributo e utilizando o montante que seria cobrado como base para ampliação patrimonial ao longo do tempo). O diferimento tributário, diz o governo, resulta em vantagens não isonômicas, “quebra da neutralidade tributária e distorção alocativa, em prejuízo dos interesses nacionais”.

O caso dos fundos exclusivos é similar. Atualmente tal modalidade de aplicação financeira é utilizada por famílias de maior renda (com patrimônio de no mínimo R$ 10 milhões), dentre outros motivos, pela vantagem do diferimento tributário ‒ desta forma, rendimentos que já teriam sido tributados em um fundo convencional poderiam servir para acumulação de patrimônio pelo investidor ao longo do tempo, ampliando sua rentabilidade no período. Na prática, uma vantagem viabilizada pela regressividade do sistema, que investidores de maior renda têm a opção de pagar menos tributo do que a média.

Fundos de investimento podem ser constituídos na forma de condomínios abertos ou fechados. Os fundos abertos admitem o resgate de cotas a qualquer tempo, permitindo a entrada e saída de cotistas. Os fundos fechados, embora não admitam o resgate de cotas antes do encerramento, permitem a amortização de cotas ‒ o que possibilita a distribuição de recursos aos cotistas, periodicamente, de forma similar ao resgate.

Por medida provisória editada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (MPV 1184/2023), agora incorporada ao texto do PL das “offshores”, os rendimentos de fundos exclusivos estariam sujeitos à cobrança de Imposto de Renda antes do resgate ou de seu encerramento por parte do investidor, de forma semestral, como já acontece nos fundos abertos. A mudança se aplica não apenas sobre os rendimentos gerados a partir desta data como os chamados “estoques” ‒ ou seja, rendimentos das aplicações gerados até agora e não tributados.

Também há retenção de IRPF no momento da amortização, resgate ou alienação de cotas, ou de distribuição de rendimentos, se ocorrerem antes da data de incidência da tributação periódica (o “come-cotas”). Neste caso, é aplicada uma alíquota complementar até alcançar as alíquotas atualmente previstas para esses investimentos na legislação, de 22,5% a 15%, dependendo do prazo.

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Marcos Mortari

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