Cúpula da Amazônia: cooperação esbarra em falta de metas em comum e divergência sobre petróleo
Criticada por ambientalistas por não citar qualquer esforço para interromper a exploração de petróleo na região Amazônica ou conter o garimpo ilegal, a declaração de Belém, assinada pelos líderes dos oitos países sul-americanos que participaram da Cúpula da Amazônia, estabelece 113 pontos para nortear ações de proteção à floresta e aos direitos dos povos indígenas.
Sem uma meta em comum, a Aliança Amazônica de Combate ao Desmatamento deverá se pautar por objetivos estabelecidos por cada país, internamente. A ministra brasileira do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva (Rede Sustentabilidade), reafirmou que o País pretende manter seu compromisso de zerar o desmatamento na Amazônia até 2030, apesar de não ter havido consenso sobre o tema durante a Cúpula.
“O processo de negociação é sempre mediado. Ninguém pode impor a sua vontade. Então, são os consensos progressivos – na medida em que temos alguns consensos, a gente vai botando no documento. Uma coisa muito importante que aconteceu é que todos os países concordam que a Amazônia não pode ultrapassar o ponto de não retorno, ou seja, o ponto de quando não há volta. Porque, se ultrapassar 25% de desmatamento, a floresta entra num processo de savanização”, disse Marina Silva.
“Aí, é um ponto de não retorno. Será a destruição da floresta. E a destruição da floresta significa a destruição, sobretudo, do nosso sistema de chuvas. Nós só não somos um deserto porque temos a Amazônia. Isso a gente tem que pensar com muita atenção. Quando se diz desmatamento zero é porque a ciência e o consenso estão nos mandando parar, porque essa floresta é responsável pelas chuvas, por 75% do PIB [Produto Interno Bruto] da América do Sul e pelo equilíbrio do planeta”, defendeu.
Durante o encontro, o presidente colombiano Gustavo Petro fez um pronunciamento contundente ao pedir o fim da exploração de petróleo na região hoje em curso no Suriname e debatida no Brasil, como forma de proteger o ecossistema. Ele criticou decisões políticas que mantêm o investimento em combustíveis fósseis, que são consideravelmente mais poluentes e que agridem a natureza ao longo da cadeia produtiva.
“Há um enorme conflito ético, sobretudo por forças progressistas, que deveriam estar ao lado da ciência. [Os governos de] direita têm um fácil escape, que é o negacionismo. Negam a ciência. Para os progressistas, é muito difícil. Gera então outro tipo de negacionismo: falar em transições”, declarou.
A fala causou incômodo no lado brasileiro. Em resposta ao posicionamento do presidente colombiano, o chanceler brasileiro, Mauro Vieira, afirmou que cada país tem um ritmo próprio para alcançar as metas de descarbonização.
“A posição da Colômbia não é divergente. A posição é convergente e cada país tem que seguir um ritmo, um passo que tiver ao seu alcance. Há muitos países que têm uma matriz energética ainda muito dependendo do carvão e de combustíveis fósseis. Eles, evidentemente, estarão mais distante, mas não significa que estarão contra [a descarbonização]”, rebateu.
“Não se pode negar ao povo brasileiro o direito de conhecer as suas potencialidades. O que se discute nesse momento, não é a exploração de petróleo no Amazonas, muito pelo contrário. Nós estamos falando de 500 km da foz do Amazonas e 188 km do Oiapoque”, complementou o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira.
Lula, que desde os seus dois primeiros mandatos como presidente busca construir blocos multilaterais com nações menos desenvolvidas, tem pedido repetidamente aos países ricos e industrializados que cumpram seus compromissos de financiar ações sobre mudanças climáticas em países mais pobres que pouco fizeram para causar o aquecimento global.
Na Cúpula, o líder brasileiro tem trabalhado para formar uma frente de união entre as nações com floresta tropical, que além dos países amazônicos inclui Indonésia, Congo e República Democrática do Congo, para tratar de pautas em comum.
De acordo com o professor de Relações Internacionais do Centro Universitário Belas Artes de São Paulo e da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), Demetrius Pereira, o engajamento de Lula pela proteção da Amazônia pode ser interpretado como um aceno a parte das exigências ambientais feitas pela União Europeia para a conclusão do acordo comercial com o Mercosul, já que o Brasil é o único país do bloco, que também reúne Argentina, Uruguai e Paraguai, que possui larga extensão territorial em área de floresta.
“Reunir todos os países amazônicos, depois de anos, simboliza uma união, buscando uma revitalização da Organização Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), que estava paralisada, e que passa a ter sede em Brasília. Será a única organização internacional sediada aqui no Brasil”, avaliou.
“O Brasil já vinha buscando uma resposta às demandas da União Europeia, que cobrava do Mercosul uma ação de maior proteção ambiental. Dos países do Mercosul, só o Brasil faz parte da OTCA. Então parece que o Brasil conseguiu responder as exigências europeias convocando essa reunião e fazendo com que os líderes da região amazônica estivessem presentes”, afirmou.
Entre outros pontos, a Declaração de Belém também prevê a participação de bancos de desenvolvimento dos países amazônicos a partir de uma iniciativa batizada de “Coalizão Verde”, que promova soluções financeiras para estimular atividades produtivas locais respeitando as características regionais.
Ainda de acordo com o documento, o governo brasileiro se comprometeu a instalar o Centro de Cooperação Policial Internacional em Manaus para a integração entre as polícias dos oito países. No âmbito da OTCA, está prevista a criação de algumas instâncias. Entre elas, o Mecanismo Amazônico de Povos Indígenas; o Painel Técnico-Científico Intergovernamental da Amazônia, que contará com as participações governamentais, de pesquisadores, da sociedade civil, bem como dos povos indígenas e de comunidades locais e tradicionais.
(Com Agências)
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