A longa batalha de Appy pela reforma dos impostos
O texto da reforma tributária – previsto para ser votado no plenário da Câmara dos Deputados nesta semana, após 35 anos de tentativas frustradas – tem a cara de Bernard Appy, um economista que está debruçado sobre o atual projeto há oito anos ininterruptos.
Escolhido pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para comandar uma secretaria extraordinária criada especialmente para trabalhar pela aprovação da reforma em duas etapas ao longo de 2023, Appy prefere ficar distante desse rótulo e deixar o protagonismo para o Congresso. Mas também está por trás das negociações, seguindo a máxima que é sempre repetida em Brasília: sem a participação do governo, a reforma não avança.
Em Brasília, o apelido “Apinaldo” se tornou a síntese do texto da reforma. Enquanto Appy é o formulador técnico da proposta, o relator, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), faz costuras políticas para criar as condições para aprovação.
O embate com os setores de serviços e do agronegócio e com tributaristas, os mais resistentes desde o início das discussões da reforma, custou a Appy a fama de “intransigente” e de estar sendo “financiado pela indústria”.
Críticas que continuam sendo usadas pelos que querem barrar a reforma, mas que vêm perdendo força à medida que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), pavimenta o caminho para a votação. Os que contavam que a reforma seria barrada agora correm para negociar.
Não é a primeira vez que Bernard Appy comanda as discussões no Poder Executivo para implementação da reforma. Ele começou a se aprofundar no assunto quando estava à frente da Secretaria de Política Econômica, entre 2008 e 2009, no segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Antes de assumir a Secretaria de Política Econômica de Lula, Appy havia passado pelo cargo de secretário executivo da Fazenda, no qual, segundo já afirmou, passava 80% de seu tempo tentando segurar os gastos públicos. Ele chegou ao governo petista graças a uma experiência que havia tido no início da carreira, como assessor econômico da liderança do PT na Câmara dos Deputados, entre 1989 e 1991.
Appy havia sido, nos anos 80, colega na Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária da Universidade de São Paulo (FEA-USP) de Fernando Sampaio, filho de Plínio de Arruda Sampaio. O então deputado petista convidou Appy para trabalhar como assessor na casa. Lá, ele teve contato com os processos de criação de um projeto de lei, o que lhe ajudaria na elaboração do texto da reforma.
Crise
Appy deixou Brasília em 2009, após ver que a reforma tributária não avançaria e depois de passar 2008, assim como todo o Ministério da Fazenda, focado na crise financeira que abalava o mundo. Ao regressar a São Paulo e após uma breve passagem pela BM&FBovespa, voltou a trabalhar na consultoria LCA, empresa da qual havia sido sócio entre 1995 e 2002.
Até os adversários da reforma destacam o trabalho de persistência de Appy em manter vivo por anos o tema da reforma tributária, enquanto poucos estavam fazendo isso. Para aliados, ele é visto como técnico preparado, que inequivocamente conhece o tema do IVA e encontrou no ministro Haddad o capital político para levar a proposta à frente.
Entre empresários, governadores e prefeitos, a desconfiança que recai sobre ele, Haddad e o presidente Lula segue sendo a do risco de elevação da carga tributária – tema que exigirá mais negociações.
Procurado pelo Estadão para comentar o relatório de Ribeiro, Appy seguiu o script de falar pouco para não se comprometer: “O parecer confirma a manutenção das principais diretrizes de uma reforma da tributação do consumo baseada nas melhores práticas internacionais, respeitando as especificidades do federalismo brasileiro, e que contribuirá para gerar crescimento econômico, emprego e renda”.
Antes mesmo da votação, Appy já está debruçado na regulamentação da PEC e na elaboração da segunda fase da reforma, que vai tratar da tributação do Imposto de Renda. Por uma conjunção de fatores políticos, ele chegou ao centro da reforma quando, em 2019, o então presidente da Câmara, Rodrigo Maia, precisou de uma proposta para modernizar o sistema tributário. Quem tinha uma pronta era ele. Agora, está mais próximo do que nunca nesses últimos 35 anos de vê-la aprovada.
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