Modelo de “cashback” enfrenta resistências em debate sobre reforma tributária
Um dos pontos em discussão na reforma sobre os impostos indiretos pelo Grupo de Trabalho da Reforma Tributária na Câmara dos Deputados, a possibilidade de adoção de um sistema de “cashback” para a aquisição de produtos da cesta básica por grupos de baixa renda da população não é consensual no mundo político.
A ideia tem sido frequentemente defendida pelo secretário extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, nos debates em que participa. Ele aponta o instrumento como forma de focalizar os benefícios fiscais de produtos de primeira necessidade a camadas da população mais necessitadas.
Isso na prática permitiria uma retirada da isenção tributária sobre tais produtos para outros grupos da população que hoje são beneficiados de forma “desnecessária” pela desoneração completa, já que em tese não precisariam do auxílio.
Este seria um dos pontos da nova reforma que visam reduzir a chamada “regressividade” do atual sistema, no qual pobres pagam proporcionalmente mais impostos do que os mais ricos. O benefício focalizado em faixas da população que realmente necessitem, argumentam os defensores da ideia, abriria condições para maior efetividade da política pública.
Mas parlamentares que participam das discussões veem problemas no modelo. Uma linha de preocupação vem sendo apresentada há anos pelo deputado federal Mauro Benevides Filho (PDT-CE), que alega que o modelo de “cashback” exigiria “capital de giro” da população mais pobre, que teria que adquirir com impostos produtos que hoje são isentos para, somente depois de um determinado tempo, ser beneficiado da devolução dos valores recolhidos.
Um dos caminhos para sanar o problema seria a implementação de um modelo em que o “cashback” ocorreria de forma automática e imediata – o que alguns deputados ainda acreditam que pode apresentar dificuldades de implementação no país todo.
Benevides aponta como alternativa o uso do próprio CadÚnico (Cadastro Único para Programas Sociais), o registro nacional mais completo sobre beneficiários de determinadas políticas públicas. A ideia seria que o cidadão registrado, no ato da compra de um produto da cesta básica, possa ter isenção de tributos ao apresentar seus documentos em um estabelecimento comercial.
Como forma de combater fraudes, a partir do uso indevido de um CPF beneficiário por terceiros, o parlamentar sugere a aplicação de um teto para compras isentas. Uma vez superado o valor pago em produtos da cesta básica em um período específico, o cidadão beneficiário passaria a ser tributado no excedente até a renovação do ciclo.
A correção de distorções no sistema tributário brasileiro é um dos eixos de maior preocupação de parlamentares no debate sobre os impostos sobre o consumo. Há uma expectativa, contudo, de que a progressividade seja assunto central na segunda etapa do debate sobre a reforma, quando os parlamentares se debruçarem sobre os tributos sobre a renda – o que está previsto para ocorrer apenas no segundo semestre.
Nesta terça-feira (18), o GT da Reforma Tributária realiza audiência pública com especialistas para abordar a perspectiva distributiva, com foco em aspectos sociais, de gênero e raça e a própria implementação de um modelo de “cashback”.
Um dos setores mais preocupados com as mudanças no sistema tributário em discussão é o agronegócio, que também tem resistências específicas ao “cashback” para produtos da cesta básica. Produtores temem que a mudança eleve preços e reduzam o consumo.
O deputado federal Pedro Lupion (PP-PR), presidente da Frente Parlamentar Agropecuária, diz que a medida, apesar de “bem-intencionada”, vai fazer com que os preços subam na gôndola e provoquem amento da inflação e do custo de produção no país.
“Socialmente temos que ter a responsabilidade de saber o que é impactante para o país, para também quem produz e quem consome não sofrer esse impacto e não ter um problema sério na economia nacional”, disse em entrevista concedida em março ao InfoMoney.
“A questão da tributação da cesta básica é algo que nos preocupa, não pelo conceito, mas principalmente por entender que cashback não vai funcionar. Pelas nossas contas, ele seria só de R$ 25,00 por cesta básica − ou seja, não amenizaria a vida do consumidor; o melhor para ele seria ter o produto mais barato na gôndola mesmo” pontuou.
Formada por 300 deputados e 41 senadores, a Frente Parlamentar Agropecuária tem forte influência sobre os rumos do Congresso Nacional e também poderá ser ator relevante para o desfecho das Propostas de Emenda à Constituição (PECs) de reforma tributária em discussão.
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