Guajajara insiste para que Lula vete marco temporal; Fávaro defende equilíbrio
A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, está insistindo para que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vete o projeto de lei do Marco Temporal, que ela e líderes indígenas alertam que prejudicaria os direitos ancestrais à terra e ameaçaria o estilo de vida dessa população.
O projeto, aprovado no Senado no final do mês passado e que agora aguarda a sanção de Lula para se tornar lei, restringiria a demarcação de terras aos locais ocupados por indígenas até 1988, prazo que o Supremo Tribunal Federal (STF) já declarou inconstitucional.
Lula tem até 20 de outubro para vetar o projeto, o que o colocaria contra o poderoso lobby do agronegócio.
A ministra disse à Reuters que está atuando para que o presidente não sancione o projeto. A Articulação Povos Indígenas do Brasil (Apib) está fazendo campanha nas redes sociais pedindo que Lula vete o projeto em sua totalidade.
“Ainda não podemos garantir que Lula vai vetar todo ou se vai vetar partes, mas certamente vai haver vetos”, disse Guajajara em entrevista.
Os agricultores têm afirmado que o projeto de lei garantirá maior segurança jurídica à propriedade de suas terras, reduzindo os conflitos fundiários à medida que a fronteira agrícola brasileira avança sobre a região amazônica.
O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, espera uma solução negociada.
“Com a decisão do Supremo, mais a decisão do Congresso, cada um fazendo a sua parte, vamos chegar a um bom termo, vamos chegar ao equilíbrio que é tão necessário para esse assunto”, disse ele à Reuters.
O governo havia planejado vetar todo o projeto, mas agora está estudando maneiras de preservar parte da legislação para evitar um conflito crescente entre o Congresso e o STF, segundo pessoas familiarizadas com as deliberações.
“O certo é que a espinha dorsal do texto, o marco temporal em si, vai ter que ser vetado porque é inconstitucional”, disse uma fonte do gabinete do presidente. “Se for mantido, vai para o STF derrubar de novo e só acirra a crise”, disse uma fonte no Planalto.
Guajajara disse que os defensores dos agricultores, criadores de gado, garimpeiros e outros setores influentes no Congresso apressaram a aprovação do marco, não deixando espaço para debate.
“Eles olham o marco temporal para garantir territórios tradicionais indígenas que foram invadidos e ocupados por não indígenas e poder manter esses territórios como propriedade privada”, disse ela.
Os parlamentares anexaram outras propostas anti-indígenas, disse ela, de modo que o projeto de lei permite a mineração comercial e a agricultura nas reservas, incluindo o uso de culturas geneticamente modificadas, e o arrendamento de terras a agricultores não-indígenas, o que atualmente é proibido.
Se o projeto se tornar lei, limitaria a criação de novas reservas e a expansão das existentes.
“Também uma coisa muito ruim é a expropiação de povos indígenas de seus territórios quando eles apresentam alteração de traços culturais. Isso estimula o preconceito e até o racismo”, disse Guajajara à Reuters.
Kleber Karipuna, coordenador executivo da Apib, disse que o projeto de lei é “totalmente inconstitucional” e representa uma ameaça à existência de 1,6 milhão de indígenas no Brasil. Ele acrescentou que sua organização pedirá ao STF que o revogue caso se torne lei.
“Pedimos uma audiência com o presidente Lula. Estamos aguardando o retorno”, disse ele em entrevista.
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