Comissão mista aprova MP do salário mínimo, nova faixa de isenção do IR e tributação de “offshores”

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A comissão mista que analisa a medida provisória do novo salário mínimo (MPV 1172/2023) no Congresso Nacional aprovou, nesta terça-feira (8), em votação simbólica, o parecer do relator, deputado Merlong Solano (PT-PI).

Durante a tramitação no colegiado, foram incorporadas ao texto outras propostas de interesse do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em uma vitória da equipe econômica ‒ especialmente do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), que conta com as medidas para equilibrar as contas públicas e entregar déficit zero em 2024.

O texto ratifica o novo salário mínimo a R$ 1.320,00, vigente desde 1º de maio de 2023. Os valores diário e horário também foram aprovados a R$ 44,00 e R$ 6,00, respectivamente, conforme previa a proposta original encaminhada pelo Palácio do Planalto.

Pela versão aprovada, também ficam estabelecidas as diretrizes para a política de valorização do salário mínimo, que entra em vigor a partir de 2024. O valor dos reajustes decorrerá da soma do índice de medida da inflação do ano anterior, para a preservação do poder aquisitivo, com o índice correspondente ao crescimento real do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos anteriores.

A inflação utilizada como base de cálculo será a do o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), acumulada em 12 meses até novembro. Em caso de crescimento real negativo da economia, o reajuste do mínimo não incorporará a variação do PIB, mas apenas da inflação.

O parecer aprovado pelos deputados e senadores integrantes da comissão também incorporou pontos de outra medida provisória (MPV 1171/2023) que trata da atualização da faixa de isenção da tabela do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) e da tributação de “offshores” mantidas por brasileiros no exterior e que regulamentava o funcionamento dos trusts.

Tais pontos corriam risco de “caducar”, já que esta segunda medida provisória perde validade em 27 de agosto e sequer teve comissão mista instalada no parlamento. Agora o parecer do deputado Merlong Solano segue para análise do plenário da Câmara dos Deputados. Caso aprovado, vai ao Senado Federal. O prazo para ser remetido à sanção presidencial é até 28 de agosto.

Além das mudanças no salário mínimo, o texto atualizou em 10,9% a faixa de isenção do IRPF, de R$ 1.903,98 para R$ 2.112,00, após 8 anos sem alterações. Como forma de compensação dos impactos fiscais previstos, foi lançada uma nova tentativa de modificação na estrutura de tributação da renda aferida por pessoas físicas residentes no país em aplicações financeiras feitas no exterior.

A MPV na versão aprovada unifica a tabela do imposto cobrado sobre aplicações no exterior (antes dividida entre renda e ganhos de capital), cria regras para a tributação em casos de empresas controladas no exterior (“offshores”) e introduz de forma inédita legislação sobre os chamados “trusts”.

Também é criada uma janela de transição, com adesão facultativa, em condições específicas de tributação favorecida, para o contribuinte atualizar o valor de bens e direitos mantidos fora do Brasil e se adequar às novas normas.

Leia também: Tributação sobre investimentos no exterior: o que muda com a nova medida provisória do governo

A medida é vista nos bastidores como uma espécie de “ensaio” para a segunda etapa da reforma tributária planejada pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), focada nos impostos sobre a renda, que deve sair do papel logo após a discussão sobre a reforma que trata da tributação sobre o consumo pelo Congresso Nacional.

As mudanças não afetam investimentos em território nacional nem aplicações envolvendo pessoas jurídicas brasileiras em outros países.

Na ponta do lápis

Técnicos do Ministério da Fazenda estimam que a atualização da tabela do IRPF, em vigor desde 1º de maio, terá impacto negativo de R$ 3,20 bilhões sobre as contas públicas em 2023. Os cálculos indicam que a renúncia tributária será de R$ 5,88 bilhões em 2024 e de R$ 6,27 bilhões em 2025. A promessa de Lula é levar a faixa de isenção para R$ 5 mil até o fim do seu mandato.

Do outro lado, os cálculos do governo indicam que a nova legislação envolvendo aplicações financeiras no exterior tem potencial de gerar arrecadação de R$ 3,25 bilhões em 2023 (neste caso, restrito à atualização do valor de bens e direitos, já que o novo regime de tributação da renda auferida no exterior somente começaria a gerar efeitos fiscais no ano seguinte), de R$ 3,59 bilhões em 2024 e de R$ 6,75 bilhões em 2025.

A equipe econômica argumenta que a medida oferece uma solução para o fato de haver mais de R$ 1 trilhão (ou US$ 200 bilhões) em ativos mantidos por brasileiros no exterior que “não pagam praticamente nada de IRPF sobre rendas passivas” com as regras vigentes, que permitiam o diferimento do imposto (ou seja, a procrastinação de qualquer recolhimento).

Atualmente, os investimentos de pessoas físicas no exterior podem ser estruturados de diversas formas. Uma das mais conhecidas são as sociedades − chamadas tecnicamente como Private Investment Companies (PIC), mas também referidas como “offshores”.

Nessas estruturas, o contribuinte pode utilizar de mecanismos para que a entidade intermediária aufira os rendimentos de ativos, mas represe os rendimentos no exterior, passando anos sem distribuí-los ao sócio pessoa física brasileira.

Na prática, isso implica o diferimento da tributação até o momento da efetiva transferência pela entidade para o sócio pessoa física residente no Brasil, seja em conta corrente em território nacional ou no exterior, ou no uso dos recursos para o pagamento de despesas pessoais do titular. É o chamado “regime de caixa”, que deixaria de existir para os lucros aferidos por offshores a partir de 2024.

No texto de exposição de motivos da MPV 1171/2023, o governo alega que o atual sistema provoca uma “quebra da neutralidade tributária” e “distorção alocativa”, em prejuízo aos interesses nacionais. Uma das consequências disso é a redução do potencial arrecadatório do Estado e possíveis impactos sobre a execução de políticas públicas, em prejuízo de camadas economicamente mais vulneráveis da população.

A situação é análoga à que ocorre no caso dos fundos exclusivos, em que o contribuinte passa anos sem recolher nenhum imposto – ao contrário do que ocorre com o chamado “come-cotas” na maioria dos fundos. Esses fundos também estão na mira da equipe econômica do governo.

Atualmente, os rendimentos auferidos por investimentos feitos diretamente pelas pessoas físicas no exterior podem ser tributados como rendimento ou como ganho de capital. No primeiro caso, estão enquadrados os ganhos recorrentes na forma de renda, como dividendos, aluguéis de imóveis, juros e cupons.

A tributação, nesta categoria, se dá pela tabela progressiva do Imposto de Renda – a mesma que incide sobre salários. Até 30 de abril, a tabela fixava na faixa de isenção ganhos mensais de até R$ 1.903,98 e a alíquota máxima, de 27,5%, incidia sobre os valores que ultrapassassem R$ 4.664,68. Com a MPV 1172/2023, a isenção subiu para R$ 2.112,00 e as demais faixas foram mantidas.

O cálculo do IR devido pode ser feito no programa Carnê-Leão, e os rendimentos estão sujeitos ao ajuste anual, com possíveis deduções legais ou soma a outros rendimentos com tratamento de natureza similar dado pela legislação – o que pode elevar os valores devidos.

Já no caso de ganhos de capital com venda, resgate ou liquidação de ativos, como vendas de ações e imóveis ou resgates de cotas de fundos, aplica-se uma tributação exclusiva/definitiva separada, seguindo uma tabela que vai de 15% (para ganhos até R$ 5 milhões) a 22,5% (para o valor que superar R$ 30 milhões). O DARF, nesta situação, é gerado pelo programa GCAP.

Para esta categoria de rendimento, há um limite de isenção do IR para os chamados bens e direitos de pequeno valor. Este montante é de R$ 20 mil para alienação de ações negociadas no mercado de balcão e de R$ 35 mil nas demais situações.

Nas duas situações, o IR é calculado e pago apenas no momento da efetiva realização do ganho. É o chamado regime de caixa. O recolhimento é feito a cada mês em que houver percepção dos ganhos pelo contribuinte, ativo por ativo.

Hoje, o sistema tributário nacional também prevê possibilidade de compensação do imposto já pago no exterior, desde que o país onde foi feito o investimento tenha acordo de não bitributação com o Brasil.

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Marcos Mortari

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