CPI do MST: debatedores divergem sobre assentamentos da reforma agrária
Em audiência pública na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), na Câmara dos Deputados, nesta semana, o ex-presidente do Incra Francisco Graziano Neto defendeu a suspensão do programa de reforma agrária até que se regularize a situação dos assentamentos atuais.
Segundo Graziano, que também foi deputado federal pelo PSDB, “há estudos que demonstram inúmeras irregularidades” nas áreas ocupadas. Ele citou a existência de beneficiados que não atendem os pré-requisitos do programa e até mesmo concentração de terras dentro dos assentamentos.
Ainda conforme Graziano, a reforma agrária também não compensa do ponto de vista econômico. Mesmo admitindo que não haja dados consolidados sobre o programa no Brasil, Graziano apresentou números segundo os quais somente um lote em assentamento custa, em média, R$ 217 mil. Em contrapartida, a renda líquida média do beneficiário seria de apenas R$ 288 mensais.
“A geração de renda é francamente decepcionante, porque não gera renda para os beneficiários. Então, em termos de política pública, se fosse fazer uma comparação grosseira, teria sido mais vantajoso você pegar esse dinheiro e distribuir como um auxílio”, opinou.
Relator da CPI, o deputado Ricardo Salles (PL-SP) afirmou que os dados demonstram que a política de reforma agrária “não faz nenhum sentido”.
“Nós estamos colocando dinheiro público, gerando expectativa para essas pessoas, fazendo todo um movimento que atinge a estabilidade jurídica da propriedade no Brasil para fazer com que esses assentados vão auferir renda de R$ 3.500 por ano. A pessoa coloca R$ 217 mil e não aufere 2% de renda sobre o investimento feito, a poupança daria três vezes mais que esse resultado”, disse.
Na opinião do deputado Valmir Assunção (PT-BA), integrante do MST, não se deve julgar a reforma agrária somente do ponto de vista dos custos que o programa gera para o Estado. O parlamentar lembrou que o governo também subsidia outros setores, como a indústria. Além disso, sustentou, assentar as pessoas no campo é melhor que deixá-las nas periferias das cidades.
“Quanto custa para criar um emprego na cidade, para montar uma indústria? De quanto o Estado brasileiro dispõe em isenções para esses grandes empresários?”, questionou. “É caro fazer reforma agrária, se dividir esses recursos que gasta em uma desapropriação pode ser até melhor. Aí você vai colocar essas pessoas onde? Nas cidades, nas periferias dessas grandes cidades, é isso que vocês propõem?”, questionou.
Convidado de outra audiência pública na CPI do MST, o professor aposentado e pesquisador sênior voluntário da UnB José Geraldo de Souza Junior defendeu a reforma agrária como processo fundamental de democratização da sociedade brasileira. Para o professor, o “MST é conflito, mas é também projeto”.
“Nesse projeto, não é só a reforma agrária que está em causa, por ser – e é – uma das principais formas de emancipação do povo trabalhador, mas é também a democratização do acesso à terra, da produção econômica e ecologicamente sustentável no campo”, afirmou o professor. “É assegurar soberania alimentar e assegurar acesso igual, na mediação de uma constitucionalidade que acolhe porque emancipa e dá status de dignidade participativa a todos e todas no contexto legítimo da participação democrática no espaço público da cidadania.”
O professor José Geraldo de Souza Junior ainda defendeu que a CPI deveria contribuir para resgatar o princípio constitucional da função social da propriedade, que, conforme sustentou, não deve atender mais somente à “ganância e à acumulação egoísta”.
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